quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

FATO RELEVANTE – “São Luiz” atracou fora da área de ISPS-Code.

O navio mercante “São Luiz” continuou a causar surpresas mesmo após ter chegado a Porto Alegre. Se no texto anterior sua lentidão e o fato de seus guindastes estarem sempre erguidos foi o tema de nossa abordagem. Neste texto as atenções se voltam para o fato dele ter atracado fora da área protegida pelo Código Internacional de Proteção para Navios e Instalações Portuárias – ISPS-Code.





A LUTA DE PORTO ALEGRE PARA CONQUISTAR O ISPS-Code

O sistema que foi implantado junto a parte do Porto Organizado de Porto Alegre, a muito custo. Num processo que durou 05 (cinco) longos anos. Sendo finalmente vistoriado e aprovado no início do mês de janeiro do ano de 2012, por parte da Comissão Nacional de Segurança Pública dos Portos, Terminais e Vias Navegáveis – CONPORTOS. Deu ao nosso porto um status todo especial.

É interessante notar que apenas uma parte do Porto Organizado de Porto Alegre esta sob efeito deste sistema de segurança. Todo o cais Mauá e Marcílio Dias não são contemplados por este sistema. E no cais Navegantes apenas a parte compreendida entre o terminal operado pela Companhia Estadual de Silos e Armazéns – CESA e o terminal Graneleiro SPH estão compreendidos neste sistema. As demais área não são seguras segundo os padrões internacionais vigentes.


FORA DA LÓGICA DE SEGURANÇA

Estranho é constatar que, fugindo a toda a lógica do longo processo que habilitou o nosso porto ao mais importante sistema de segurança portuário. O navio mercante “São Luiz” atracou em uma área não protegida. E que este fato compromete um trabalho sério realizado pelo Governo Federal. No qual já foram investidos mais de 150 milhões de reais na qualificação de nossos portos e terminais portuários. Com o único objetivo de habilitá-los ao comércio exterior. Do qual o país inquestionavelmente depende, para seu pleno desenvolvimento.

O navio mercante “São Luiz” trouxe sal marinho para Porto Alegre. Este produto foi originalmente embarcado no porto de Areia Branca – RN. Por tanto , trouxe um produto nacional, numa viagem de cabotagem em um dos raros navios de bandeira brasileira e de companhia 100% brasileira. No entanto o porto de Areia Branca caracteriza-se por ser dedicado exclusivamente para o embarque deste tipo de produto. E que atende não só navios brasileiros, como principalmente, navios estrangeiros. Cujo destino final será um porto estrangeiro. Seguindo a lógica do pleno respeito às regras estabelecidas pelo ISPS-Code. A atracação do navio fora de uma área segura exige a inclusão da informação no sistema de informações do navio. Se isto não ocorrer, comete-se uma infração grave no procedimento. Por outro lado, ao se fazer a inclusão da informação no histórico do navio; o mesmo terá dificuldade para atracar em um porto ou terminal protegido pelas regras do ISPS-Code. Pois se o fizer “contamina” o local. Modificando seu status quo de seguro, e tornando-o um porto ou terminal não seguro.

Todo o aparato de segurança que o ISPS-Code coordena, e nisto se inclui deste os equipamentos, os sistemas e a parte de pessoal, visa garantir o controle absoluto do ambiente portuário. Coibindo o tráfico de drogas, armas, contrabando e pessoas, neste que é um setor sensível a segurança pública para não dizer nacional.

AS CONSEQUÊNCIAS DA INSANIDADE.

O fato ocorrido é na realidade uma insanidade local. Imagine que este navio após sair do Porto Organizado de Porto Alegre, vá para o porto de Santos, que é o maior do Brasil. Após atracar lá, as informações sobre o histórico das viagens do navio indiquem o fato as autoridades portuárias locais. E como consequência desse absurdo cometido no porto Organizado de Porto Alegre, o governo norte-americano mude o conceito do status de segurança do porto de Santos. Que é a principal porta de entrada e saída de nosso comércio exterior. Num caso extremo, nós corremos o risco de deixarmos de poder embarcar nossos produtos para aquele país por este porto. E o que é pior, este fato incluirá todos os navios que por lá passarem. Criando um efeito em cadeia de contaminação dos navios e dos portos pelos quais os mesmos tenham passado. Fazendo com que os navios não atraquem em Santos para não perder a oportunidade de também operar junto aos portos norte-americanos.

FALTA DE CONSCIÊNCIA E PROFISSIONALISMO

Na verdade o que estou mostrando é que faltam duas coisas básicas a quem esta administrando o Porto Organizado de Porto Alegre: CONSCIÊNCIA e PROFISSIONALISMO.

Ninguém em sã consciência joga o trabalho de anos fora, para agradar ou o que é pior, não desagradar aos interesses privados. O desconhecimento das leis que regem a atividade portuária; das regras do comércio exterior, não podem ser alegados para justificar o fato. Todo administrador público não pode se dar ao direito de errar. O seu erro é o erro do Estado.

Quando se fala em falta de profissionalismo, se fala da responsabilidade de quem administra a coisa pública. Que tem de exercer suas obrigações no mais alto grau de competência.

PORQUE ISTO OCORREU ?

Em 2011, o porto de Porto Alegre teve seus guindastes interditados pela fiscalização do Ministério do Trabalho. A falta de manutenção adequada era o fato gerador dos problemas ali constatados.

Inexplicavelmente os guindastes não possuíam um profissional habilitado para ser o responsável pela correta manutenção de seus equipamentos. Profissional com titulação para isto existia. Mas o mesmo não queria assumir as tarefas pertinentes a sua formação profissional. Agregasse ao fato, a total falta de cultura do controle da manutenção. Não se tinha nada escriturado. Logo não se sabia o que havia sido feito ou o que se deveria fazer, e quando isto deveria ocorrer. Na sequencia, também os equipamentos careciam de laudos periódicos que atestavam seu real estado de conservação.

O ESFORÇO REALIZADO NA MANUTENÇÃO DOS GUINDASTES

Com o objetivo de mudar esta situação um esforço muito grande foi desenvolvido no intuito de resolver os problemas. Inicialmente se deslocou para o setor um profissional habilitado. A ação infelizmente não surtiu o efeito desejado. Na sequencia se contratou um perito para realizar a avaliação dos equipamentos e determinar os quesitos necessários para a reforma e recuperação dos mesmos. Feito isto se deu partida na reforma do guindaste N° 18, com confecção de edital. O processo tramitou com todo o apoio da máquina administrativa do Estado principalmente no setor de licitações. E seu resultado foi publicado na passagem de 2011 para 2012. A verba reservada para executar o serviço em 2011 foi garantida para o ano seguinte. E o início dos trabalhos foram constantemente vistoriado pelo diretor de porto da época, o engenheiro Silvio David. Funcionário de carreira do Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem – DAER, com larga experiência na administração pública. Com minha saída e a do Silvio da Superintendência de Portos e Hidrovias – SPH o controle passou a ser responsabilidade de quem nos substituiu.

OS ERROS SE REPETEM

A troca na administração da SPH mostrou-se ineficiente no que tange ao trabalho até então desenvolvido. Isto se prova pelos problemas verificados ao longo do ano de 2012. No qual o guindaste N°18 já no primeiro dia de operação apresentou problema e teve de parar. Posteriormente, em 2013, o mesmo veio a ser interditado novamente pelo Ministério do Trabalho. Tendo como um dos quesitos assinalados a falta de controle de sua manutenção. E para o guindaste N°19 não foi planejado ou realizado sua reforma a exemplo do que foi feito para o N°18, no ano de 2011.

O que se viu, foi um amadorismo no tratamento da coisa pública. Já que o próprio guindaste N°18 recebeu uma cobertura de tinta laranja, sem que a anterior tivesse ao menos sido removida, como mandam os manuais básicos de pintura. Mas se o objetivo era mostrar trabalho, nada melhor do que uma pintura nova para assim o fazer. E é o que foi feito.

ENTRE O INTERESSE PRIVADO E O PÚBLICO

Apenas para exemplificar, o assunto, com um fato do passado. No ano de 2011, mesmo com os guindastes interditados se levantou a interdição para descarregar um navio. Naquela época o navio também chegou com um carregamento de sal, numa viagem de cabotagem. No entanto ele era de bandeira estrangeira. E tinha, na Argentina, seu próximo porto de destino. O operador do navio em Porto Alegre fez de tudo para que o navio atracasse fora da área controlada pelo ISPS-Code. Alegou que os guindastes da SPH estavam interditados, enquanto que os seus podiam perfeitamente descarregar a carga. Argumentou inclusive que no passado “seu terminal” inclusive operava de forma direta com navios de bandeira estrangeira, vindos do exterior. No entanto este fato ocorreu antes dos atentados terroristas às “Torres Gêmeas”. Fato que gerou todo o movimento de criação e implantação das normas do ISPS-Code no mundo inteiro. Diante da pressão exercita, a SPH informou ao armador do navio que a área onde se pleiteava a atracação do navio não estava incluída no ISPS-Code. E que a SPH não poderia assumir a responsabilidade pela segurança do navio. Imediatamente o próprio armador se manifestou contra o fato. Dando razão à postura adotada pela autarquia que não só protegia o sistema como um todo, bem como os próprios interesses do armador. Que assim não comprometeria seus interesses econômicos de poder operara em todos os portos de primeira linha do mundo. Naquela época, com base na urgência da situação se conseguiu a suspensão da interdição e o navio foi descarregado no porto público. Mesmo sem advogados próprios, a SPH conseguiu mobilizar o corpo jurídico do Estado para lutar em prol do interesse público. Sem prejudicar o interesse privado do proprietário do navio. Infelizmente, pelo visto agora, este fato não ocorreu. Muito pelo contrário, faltou total empenho em solucionar um caso.

CONCLUSÃO

Como podemos ver, há muita coisa ocorrendo que merece uma atenção especial de nossas autoridades estaduais e federais. Somente com um olhar aguçado e criterioso é que alguns fatos podem ser realmente identificados. Já que o assunto envolve muitos interesses. Que se manifestam principalmente no conflito entre o público e o privado. No entanto o melhor caminho para solucioná-lo é com escolhas certas. Baseadas no critério da competência, e de tudo que o serviço publico prega como ideal para quem deve exercê-lo. Infelizmente quando isto não ocorre, todos nós saímos perdendo. Por culpa de quem deveria zelar pelo nosso pleno desenvolvimento econômico e social. Que em última instância é aquele que administra o nosso Estado. Pensem nisso, pois o assunto é por demais sério para ser desprezado.

Muito Obrigado!

Foto: Carlos Oliveira

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